30/11/2007

Amargurado

O véio Blau era azedo e amargurado.
A vida lapidou de forma tosca a carcaça do sujeito.
Era conhecido, entre os vizinhos, como homem de pedra.
Nunca chorou.
Nunca amou.
Nunca simpatizou com alguém.
Véio Blau não tinha filhos, cachorro, plantas e não olhava TV.
Não tinha time, partido político, cor preferida.
Não apreciava nada.
Passava horas olhando no vazio.
Alguns custavam acreditar que ele estava vivo.
E não estava.
Era um morto-vivo.
Ou melhor, um vivo-morto.
No seu leito de morte, Véio Blau delirou:
- Tião...ss...seu... saf...safaado, minhas leita...dev..devol...ve...minhas verda....nem q..que...seja a óio de gato....ou a de... a-a-aaço de rola...mento....Tiãooo....seuu laca...lacaio.......malfeitor...
-
Rezava a lenda que o falecido Tião era um neguinho esperto que morava na vizinhança lá por 1925.
Blau desafiou Tião numa partida de boco.
O neguinho, na época, era o ás da bolita.
Não é difícil imaginar que não sobrou nada no saco do menino Blau.
Perdeu as leita, as verda, as oio de gato e até a de aço de rolamento.
Depois daquele dia, o falecido Blau nunca mais foi o mesmo.

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